Caso 4 – No precedente episódio, fala-se de transmissão fonética de palavras que a personalidade mediúnica não compreendia; vem, portanto, a pêlo referir outro caso análogo e recentíssimo, que somente difere do anterior por não ser uma personalidade mediúnica quem recebe e transmite foneticamente as palavras e sim o próprio “sensitivo”, que as percebe por meio da clariaudiência e foneticamente as repete a um estenógrafo.
Refiro-me ao conhecido escritor e jornalista norte-americano William Dudley Pelley, que de súbito se tornou célebre por haver publicado, com o título Sete minutos na Eternidade, um volumezinho em que relata um caso interessante, mas que nada tem de extraordinário, com ele próprio ocorrido, em um casebre perdido nas montanhas da Califórnia, para onde se retirara em busca da quietude necessária à elaboração de um livro.
O que ele diz ter visto no mundo espiritual concorda em absoluto com o que já por mais de cem vezes descreveram várias personalidades de defuntos. Este, porém, não é o momento de discutirmos isso. Pelley jamais se ocupara com pesquisas psíquicas e não queria saber de publicar o que lhe sucedera, receando ser tomado por espiritista e ficar com a sua reputação literária comprometida. Foi o diretor do American Magazine quem conseguiu vencer-lhe a resistência, induzindo-o a escrever para essa revista uma narrativa do que lhe havia acontecido. Acerca do estado de ânimo em que se achou ao despertar, registrou ele:
“Não mais me sentia o homem que antes era, assim física, como mental e espiritualmente. Além disso, tinha consciência de haver, de certo modo, adquirido sentidos novos, novas e prodigiosas faculdades, que não posso esperar descrever de maneira perceptível a quem ainda não as experimentou, mas que, entretanto, para mim, eram reais, como a mão com que escrevo.”
Entre as novas faculdades que ele adquirira, contava-se a da “clariaudiência”, por meio da qual continuou a manter-se em relação com as personalidades espirituais com quem conversara durante os “sete minutos passados na eternidade” e, no seu volumezinho (pág. 40), refere um episódio de clariaudiência, com o objetivo de confutar os ultradoutos comentários que fisiologistas e psiquiatras haviam tecido em torno do seu caso, comentários que concluíam unanimemente por considerar o ocorrido como uma conseqüência do abuso de drogas e de tabaco. Ele responde ponderando:
“Deixemos, pois, que os modernos fisiologistas e psiquiatras expliquem o meu caso por meio da cômoda teoria da alucinação. Nada obstante, permito-me observar, a esse respeito, que as alucinações patológicas não conferem o dom de faculdades supranormais permanentes a quem a elas se acha sujeito e, ainda menos, põem os vivos em condições de entrarem em comunicação com defuntos, como se estes se achassem mais vivos do que nunca. O meu “Rádio” mental despertou de maneira tão prodigiosa, que nem sempre me encontro em condições de sintonizar a minha mentalidade com as mentalidades e as vibrações das “vozes” dos que existem num ambiente espiritual, donde o me ser possível conversar por conta própria com defuntos, ou por conta de terceiros, sem cair jamais em sono. Aproveito essa circunstância para dirigir aos defuntos importantes questões de toda espécie e colher inteligíveis, ótimos, preciosíssimos ensinamentos. Já tomei nota de respostas em que as palavras ultrapassam de dez mil e versam sobre os mais árduos aspectos das ciências físicas, cosmológicas e metalúrgicas. Por três ou quatro vezes na semana, dedico duas ou três horas da noite a essas lições que me chegam dos espaços sem dimensão. Isso considerando e na expectativa de que os meus doutos censores se apressem a classificar também estes admiráveis ensinamentos entre as “inépcias” propinadas como parvoíces da “subconsciência”, submeto-lhes o caso seguinte:
Depois de conversar longo tempo com uma Grande Mente, que já não é deste mundo, uma outra voz se fez ouvir, falando em língua que eu não conhecia. Defronte de mim estava a estenógrafa, a quem pedi taquigrafasse foneticamente, em escrita ordinária, as palavras, que eu claramente percebia, da estranha língua, palavras que, para isso, lhe ia repetindo. Vocábulo por vocábulo, ela as escreveu foneticamente, como eu lhas ditava, tendo o cuidado de grafá-las de modo a poderem ser lidas exatamente como eu as pronunciava. Doze páginas foram escritas nessa linguagem misteriosa. Decorridas algumas semanas, tive ocasião de submeter a mensagem a um douto filólogo, que verificou existir nela mais de um milhar de palavras em puro sânscrito. Era interessantíssimo o seu conteúdo, pois que se referia às condições em que hodiernamente se debate a civilização mundial... Advertiu-se-me de que a mensagem fora dada em língua sânscrita para refutar as teorias de muitos doutos superficiais que se deleitam em explicar estas manifestações, contáveis entre as mais portentosas da natureza, denominando-as o “subconsciente”... Quanto às insinuações de que eu, presumivelmente, abuso de drogas e do tabaco, respondo que recentemente tive de me submeter a dois exames médicos rigorosíssimos, para um “seguro de vida”, e fui dado como fisicamente perfeito.”
Este o interessante caso de xenoglossia ocorrido pessoalmente com o narrador, caso do qual se verifica que a entidade comunicante foi induzida a ditar a mensagem em língua sânscrita com o intuito de preventivamente excluir a hipótese do subconsciente. Sem dúvida, as provas da ordem desta, que com persistência se renovam há oitenta anos, deveram racionalmente bastar a eliminar para sempre aquela hipótese de que tanto se tem abusado. Em conseqüência, deveram, também, racionalmente, conduzir a reconhecer-se o fato da intervenção de personalidades espirituais nas manifestações mediúnicas. Mas, praticamente, assim não é, porque uma grande lei, providencial talvez, de inércia mental, no sentido misoneísta, domina, governa as aquisições evolutivas do pensamento humano. Por força dessa lei, quando um grupo de conhecimentos quaisquer se organizou solidamente na mentalidade humana, esses conhecimentos se tornam a tal ponto radicados e tenazes, que não podem ser vencidos, nem mesmo pelos fatos. Só por obra do tempo chegam a ser abalados e isso unicamente pelo sucederem-se no certame científico novas gerações de pensadores. Daí se segue que, ainda por muito tempo, haverá homens de ciência que se apegarão à palavra “subconsciência”, para a elucidação dos fenômenos de xenoglossia, palavra mágica aquela, que se pode comparar a uma grande sacola em que os pegadores da sobrevivência enfiam, constringem, comprimem à viva força tudo o que não chegam a explicar por outra maneira, de tal modo que, doravante, os termos “subconsciência humana” e “onisciência divina” se equivalem.
Autor: Ernesto Bozzano
Fonte: Xenoglossia